No dia 2 de Fevereiro de 1859 realizou-se a primeira viagem experimental de comboio ao sul do Tejo, ligando as estações do Barreiro a Vendas Novas, numa extensão de 56 km. Protagonista ilustre desta viagem foi o rei D. Pedro V, que, acompanhado de luzidia comitiva em que se destacavam Fontes Pereira de Melo e Joaquim António Aguiar, foi festivamente acolhido pela Filarmónica do Barreiro e saudado pela edilidade e população local. A linha, que passaria futuramente a denominar-se Sul e Sueste, entrou em funcionamento em 1 de Fevereiro de 1861, após a conclusão do ramal Pinhal Novo-Setúbal.
O primeiro troço ferroviário fora inaugurado a 6 de Junho de 1856, entre Lisboa e o Carregado, impulsionado por Fontes Pereira de Melo que, pressentiu no caminho de ferro a forma de modernizar o país, facilitando a circulação de pessoas e bens, rompendo com séculos de atraso e isolamento.
Há cerca de 150 anos o comboio representou a modernidade e operou uma revolução nos transportes e nas mentalidades, levando progresso e desenvolvimento a todo o país.
O caminho-de-ferro teve um papel determinante na evolução do Barreiro, modesta vila de pescadores e moleiros, transformada a partir de então no principal ponto de ligação Norte-Sul. Em busca de trabalho afluíram pessoas e ideias que, com os seus modos de vida, originaram uma cultura local própria, moldada por ideais de associativismo e solidariedade.
O caminho-de-ferro trouxe modernidade ao Barreiro, constituindo um motor de progresso, e, durante 1 século e meio, tem sido uma das bases do desenvolvimento local.
Sem o caminho-de-ferro o Barreiro seria hoje uma terra diferente. As oficinas, antiga estação do Barreiro, a “cocheira” ou rotunda das máquinas, a estação ferro-fluvial, a “Casa dos Ferroviários”, o bairro ferroviário, são alguns dos testemunhos que representam esse passado histórico e constituem alguns dos exemplos de um rico património industrial edificado.
Os comboios trouxeram o peso e o saber de gerações de homens e mulheres, actores/autores de um processo histórico pioneiro no desenvolvimento industrial do país que, com a sua experiência de vida, construíram associações solidárias e de classe, como o Instituto dos Ferroviários, o Sindicato dos Ferroviários do Sul e Sueste, e outras de recreio e lazer como o Grupo Desportivo dos Ferroviárias.
O caminho-de-ferro representou esperança e é a matéria com que, ao longo de 150 anos, o Barreiro vem moldando a sua identidade cultural.
Ainda hoje continua a ser assim, e mais uma vez, o caminho-de-ferro pode continuar a ser uma alavanca de progresso e desenvolvimento sustentado para o concelho.
Assim se confirme a modernização anunciada das infra-estruturas ferroviárias, com a electrificação das linhas e a adaptação das oficinas ao comboio de alta velocidade, consolidando e desenvolvendo o emprego, particularmente especializado, num domínio em que o Barreiro vem afirmando as suas competências há mais de um século.
Paralelamente é necessário não deixar desaparecer o potencial museológico, especialmente na área do Diesel, existente no Barreiro.
Infelizmente não foi esta terra escolhida para instalação do Museu Nacional Ferroviário, nem sequer de um Núcleo Museológico, por parte da CP.
Mas talvez ainda não seja tarde e seria desejável que, esta empresa com os meios de que dispõe, financeiros, técnicos e políticos, pudesse, nos anos que medeiam até às comemorações dos 150 anos dos comboios no Barreiro -1859-1861 -, brindar esta terra e esta gente com um Museu do Homem Ferroviário. Cumprir-se-ia certamente um desígnio de muitas gerações de barreirenses.
Rosalina Carmona
fotografias: Cmb, cp, barreiroweb
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