Em 1981, a Resolução da Presidência do Conselho de Ministros (Resolução 224/81 de 30 de outubro), emanada do Gabinete do então Primeiro-Ministro Francisco Pinto Balsemão, marcou uma mudança significativa na política pública de habitação em Portugal. A instrução era clara: os ministérios competentes tinham noventa dias para apresentar projetos de extinção do Fundo de Fomento da Habitação e do Instituto de Apoio à Construção Civil.

Esta decisão representou uma inversão na lógica até então adotada. O Estado, que tradicionalmente desempenhava um papel central na gestão de habitação económica e acessível, passaria a transferir essa responsabilidade para os agentes privados. Em contrapartida, o Governo comprometeu-se a dotar o setor privado com “os meios necessários ao seu pleno desenvolvimento”.

Quarenta e três anos depois, os resultados desta política são evidentes – e preocupantes. A privatização da habitação económica e a redução do papel do Estado no planeamento habitacional levaram a um aumento da desigualdade no acesso à habitação. Os preços dispararam, as rendas tornaram-se incomportáveis para uma grande parte da população, e o número de pessoas sem acesso a uma habitação digna cresceu exponencialmente.

O sonho de uma casa acessível para todos, promovido no passado pelas políticas públicas, foi substituído por um mercado habitacional guiado pelo lucro, onde a especulação imobiliária dita as regras. Cidades inteiras tornaram-se reféns de interesses privados, enquanto milhares de famílias vivem com a angústia de não conseguirem pagar a renda ou de não encontrarem um teto para morar.

Chegou o momento de questionarmos as decisões de ontem e de repensarmos as políticas de hoje. A habitação é um direito fundamental e não pode ser tratada apenas como um bem de mercado. Precisamos de um novo compromisso que devolva ao Estado o papel de garantir habitação digna e acessível para todos, investindo em soluções reais e sustentáveis que coloquem as pessoas – e não o lucro – no centro da política habitacional.

Habitação precisa-se! Não como promessa distante, mas como uma urgência presente.

1980 – Vale da Amoreira – Imagens de habitação económica e acessível projetada pelo Fundo de Fomento da habitação.