Candidatura da Arrábida a Património Mundial no Parlamento

Candidatura da Arrábida a Património Mundial no Parlamento

Os projectos de resolução do Partido Comunista Português e do Partido Ecologista os Verdes propondo o apoio da Assembleia da República e do Governo à candidatura da Arrábida a Património Mundial da Humanidade serão discutidos na próxima 6ªf, 18 de Fevereiro, pelas 10 horas, no plenário da Assembleia da República.

Apoio à Candidatura de Arrábida a Património da Humanidade

Exposição de motivos

A Cordilheira da Arrábida situa-se na extremidade meridional da Península de Setúbal, a norte do Estuário do Sado e até ao Oceano Atlântico, abrangendo os Concelhos de Palmela, Setúbal e Sesimbra. Em 1976 é criado o Parque Natural da Arrábida, através do Decreto-Lei n.º 622/76, de 28 de Julho, fundamentado em motivos de “ordem científica, cultural, histórica, paisagística, que fazem da serra da Arrábida uma zona a proteger (…) com vista ao aproveitamento integral de todos os seus recursos e potencialidades”, e a valorização de aspectos geológicos, fauna e flora –  “não se pode deixar de referir que a zona costeira da Arrábida faz parte do recorte de uma baía que constitui um dos principais mananciais do Atlântico Norte” e “ constitui ainda a serra da Arrábida um extraordinário componente natural de grande valor paisagístico, encenando panorâmicas de grande beleza natural e de secular humanização”.

A Arrábida é um sítio natural de valor excepcional e único pela sua beleza, ilustrativo da história da vida na Terra, pelos aspectos geológicos e de grande riqueza da flora, com uma componente marítima singular. Um sítio onde é possível encontrar o equilíbrio entre a natureza e a actividade humana tradicional, de elevado valor cultural material e imaterial.

Em 2001 desencadearam-se as primeiras iniciativas com o objectivo de candidatar a Arrábida a Património Mundial e em Maio de 2004, a Arrábida é incluída na Lista Indicativa Portuguesa a Património Mundial. Em 2008 a UNESCO alterou as Orientações para Aplicação da Convenção, reformulando os critérios e procedimentos de candidatura. A Associação de Municípios da Região de Setúbal (AMRS) promoveu o contacto com o Parque Natural da Arrábida para actualizar o processo e avançou com o desenvolvimento da Candidatura de Arrábida com um carácter abrangente, integrando os critérios de ordem natural, cultural e cultural imaterial, transformando-se numa Candidatura a Património Mundial Misto.

Com o objectivo de criar as estruturas de suporte da Candidatura, em Setembro de 2009 foi formalizado um protocolo de colaboração entre a AMRS e o Instituto da Conservação da Natureza e Biodiversidade (ICNB). Neste sentido foi constituída uma Comissão Executiva, que coordena todo o processo; uma Comissão de Acompanhamento, composta por 22 entidades, que assegura a sustentação técnica e científica da candidatura, englobando a participação de instituições, entidades e personalidades de reconhecido mérito científico; o Fórum da Candidatura, constituído por cerca de 50 entidades, sendo um espaço de discussão pública e uma Comissão Técnica, responsável pela elaboração do dossier. Na elaboração da Candidatura há a preocupação de envolver as diversas entidades locais, regionais, com o conhecimento da Comissão Nacional da UNESCO.

A Candidatura abrange o território da Cordilheira da Arrábida, desde o Castelo de Palmela até ao Cabo Espichel, integrando a área marinha, designadamente o Parque Marinho Luiz Saldanha, com base nos valores naturais, a paisagem, a geologia, a fauna e a flora, os seus habitats e biodiversidade, nos valores culturais, a arqueologia, o património edificado e o património cultural imaterial.

Foram já estabelecidos protocolos de colaboração entre a AMRS e o Museu de Arqueologia e Etnografia do Distrito de Setúbal, a Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa, o Instituto Superior de Agronomia, a Fundação da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa e a Federação Portuguesa de Espeleologia, com vista à elaboração das respectivas componentes de arqueologia; geologia, geomorfologia, paleontologia, cartografia e sistema de informação geográfica, paisagem, biodiversidade e espécies de fauna e flora terrestre e ainda de espeleologia do dossier de candidatura.

1 – Critérios de Património Natural

Ao nível do Património Natural os critérios a candidatar são:

– “Representar fenómenos naturais ou áreas de uma beleza natural e de uma importância estética excepcionais”;

– “Ser exemplos excepcionais representativos dos grandes estádios da história da Terra, incluindo o testemunho da vida, de processos geológicos em curso no desenvolvimento das formas terrestres ou de elementos geomórficos ou fisiográficos de grande significado”;

– “Ser exemplos excepcionais representativos de processos ecológicos e biológicos em curso na evolução e no desenvolvimento de ecossistemas e de comunidades de plantas e de animais terrestres, aquáticos, costeiros e marinhos”;

– “Conter os habitats naturais mais representativos e mais importantes para a conservação in situ da diversidade biológica, incluindo aqueles onde sobrevivem espécies ameaçadas que tenham um valor universal excepcional do ponto de vista da ciência ou da conservação”.

A Arrábida constitui uma das mais belas paisagens portuguesas e do Mundo, com as suas montanhas, vales e picos, numa relação com a sua envolvente: o mar e o estuário do Sado. O maciço sudoeste da Arrábida possui as maiores falésias portuguesas à beira-mar, sendo o Risco a escarpa litoral calcária mais elevada da Europa. A componente geomorfológica, a vegetação, a luminosidade, a conjugação do mar, terra, céu e serra conferem à Arrábida o valioso atributo da estética.

Em relação aos aspectos geológicos a Arrábida é uma região importante para o conhecimento e compreensão da evolução da margem ocidental da sub-placa ibérica, nomeadamente a abertura do Atlântico Norte, o magmatismo e a colisão com a placa africana. A rocha Brecha da Arrábida é um exemplo de fenómenos geológicos cientificamente relevantes, sendo única a nível mundial.

A densa vegetação da Arrábida provém da evolução natural desta região, iniciada há cerca de 180 milhões de anos. A flora da Arrábida é de tipo mediterrânico, com a intrusão de algumas espécies mais atlânticas, sendo esta conjugação o que a torna única. Nas matas pode-se encontrar o carvalho português, o medronheiro, o loureiro, o zambujeiro, o carrasco. A variedade de microclimas, associado ao relevo acidentado, originou diversos biótopos, contribuindo também para uma grande variedade de fauna. Pode-se encontrar o coelho-bravo, gato-bravo, geneta, texugo, toirão, doninha e raposa; e das espécies protegidas de aves, o bufo-real, a águia-de-Bonelli, o francelho-de-dorso-liso e o falcão peregrino. No Parque Natural da Arrábida estão registadas 213 espécies de vertebrados, dos quais 8 são anfíbios, 16 são répteis, 154 são aves e 35 são mamíferos. Existem 130 espécies de borboletas. No Parque Marinho Luiz Saldanha estão identificadas mais de 1300 espécies de fauna e floras marinhas.

O posicionamento geográfico e a orografia da Serra da Arrábida permitem a diferenciação de microclimas e a existência de uma grande diversidade de espécies, sendo exemplo a diversidade ímpar da flora da Arrábida. As grutas localizadas nas arribas têm associado uma fauna muito particular, com colónias morcegos em vias de extinção como o morcego-rato-grande e o morcego-de-ferradura-mourisco. O promontório do Cabo Espichel, com os seus habitats rupestres e fendas e fissuras das falésias têm muita importância na migração de aves aquáticas e terrestres, e a nidificação de diversas espécies protegidas e/ou de conservação prioritária o que conduziu à classificação da zona do Cabo Espichel como Zona de Protecção Especial, e integra a Rede Natura 2000. A Arrábida tem ainda uma relevância nacional e internacional no que respeita aos ecossistemas marinhos. A sua riqueza marinha advém das características da Costa Arrábida-Espichel, em substratos rochoso, o que potencia a reprodução e crescimento da fauna e flora marinhas.

Os valores a candidatar nestes critérios são:

– Paisagem natural – a Cordilheira da Serra da Arrábida, desde o Morro de Palmela até ao Cabo Espichel, serras, vales, plataformas e falésias; faixa litoral; Serras e terras do Risco; Matas do Vidal; Solitário e Coberta; Formosinho; Serras do Louro e São Luís e o mar da Arrábida (Parque Marinho Luiz Saldanha).

– Aspectos geológicos – Alto da Califórnia, falha de El Carmem; rocha Brecha da Arrábida; Serra de São Luís pelos Conglomerados do Vale da Rasca; Pistas de Dinossáurio – Lagosteiros e Pedra da Mua; soleira da Paria da Foz; Gesseira de Sesimbra; Portinho da Arrábida; dobra artificial da Serra do Formosinho; Praia da Foz – penedo (estudo do Miocénico); morro de Palmela pela escama de escorregamento gravítico; Cabo Espichel; Grutas do Frade, do Zambujal, do meio, da Garganta e da Grande Falha; Lapas de Santa Margarida, das Conchas e das Areias.

– Aspectos ecológicos e biológicos – Cabo Espichel – plataforma e falésias; faixa litoral, Serras e terras do Risco; Matas do Vidal; Solitário e Coberta; Formosinho; Serra de São Luís e Parque Marinho.

– Ecossistemas naturais – parte do sítio Arrábida – Espichel da Rede Natura 2000; a Zona de Protecção Especial do Cabo Espichel; as zonas de protecção total e parcial 1 do Plano de Ordenamento do Parque Natural da Arrábida, Parque Marinho e Sistemas Cavernícolas de Sesimbra.

2 – Critérios de Património Cultural

Em termos dos critérios a Património Cultural a Candidatura da Arrábida propõe-se a “ser um exemplo excepcional de um tipo de construção ou de um conjunto arquitectónico ou tecnológico ou de uma paisagem, ilustrando um ou vários períodos significativos da história humana”.

A Serra da Arrábida constitui um espaço natural que conjuga as suas características naturais com a ocupação humana, que remonta a cerca de meio milhão de anos. Há vestígios arqueológicos do Paleolítico Inferior na Lapa de Santa Margarida no Portinho da Arrábida (200 a 400 mil anos), do Calcolítico e da idade do Bronze final na Roça do Casal do Meio e da Época Romana no Creiro. No século XVI foi construído o Convento da Arrábida e o Forte de Santa Maria da Arrábida. A arquitectura militar está presente com os Castelos Medievais de Sesimbra e Palmela e as fortalezas quinhentistas e seiscentistas, como a Fortaleza de São Filipe, de Santiago e do Outão, e um vasto património, com as várias construções religiosas, palácios e quintas.

Alguns elementos e testemunhos arqueológicos a candidatar: Grutas e Sepulcros Neolíticos na Quinta do Anjo, Castro de Chibanes, Alcaria Rural Islâmica do Alto da Queimada, Roça do Casal do Meio, Gruta da Figueira Brava, Lapa de Santa Margarida, Castelos de Sesimbra e Palmela, Fortificação do Outão, Forte de São Filipe, Fortaleza de Santiago, Forte de São Teodósio – Forte do Cavalo, Convento da Arrábida, Santuário do Cabo Espichel, Ermida da Memória, Quintas, Palácios e Solares.

3 – Critérios de Património Cultural Imaterial

Por último, ao nível de Património Cultural Imaterial a Candidatura da Arrábida propõe-se a “estar directa ou materialmente associado a acontecimentos ou a tradições vivas, a ideias, a crenças, ou a obras artísticas e literárias com um significado universal excepcional”. Só excepcionalmente este critério justifica uma inscrição na lista de candidaturas, e apenas quando aplicado conjuntamente com outros critérios culturais ou naturais.

O critério do património cultural imaterial está associado à paisagem, à geologia e à biodiversidade. As manifestações culturais associadas à Arrábida, a religiosidade, a agricultura, a pesca, a pastorícia e a gastronomia, promovem o auto-conhecimento, facilitam a comunicação e a aprendizagem, constituindo um património e configuram uma longa tradição cultural.

Neste âmbito candidatam-se: a lenda de Hildebrandt e as Festas de Nossa Senhora da Arrábida que se associam à componente paisagística e material do Convento da Arrábida; a lenda da pedra da Mua e as Festas de Nossa Senhora do Cabo que se associam à componente paisagística do Cabo Espichel, geológica das pegadas de dinossáurio e material do Santuário do Espichel e Ermida da Memória; a produção artesanal de queijo de Azeitão e da Azóia, as artes da pesca tradicional, a construção naval tradicional e as Festas das Vindimas de Palmela, que se associa à componente material dos produtos resultantes da biodiversidade específica do Mar e da Serra.

É assim inequívoco o grande valor natural, cultural e paisagístico da Arrábida, um património da Península de Setúbal, de Portugal, mas principalmente um património da humanidade que deve ser preservado para o futuro. A preservação deste património é importante para assegurar o desenvolvimento equilibrado da nossa sociedade, para a sua utilização pelo Homem, hoje e nas gerações futuras. Neste sentido, a classificação da Arrábida como Património Mundial Misto, na sua componente natural, cultural e cultural imaterial é um passo importante e imprescindível para a continuação da valorização da Arrábida.

Merece neste contexto particular apreço a AMRS pelo desenvolvimento do processo da Candidatura da Arrábida a Património Mundial Misto e o contributo imprescindível de todas as instituições, entidades e associações que se associaram a este processo e que colaboram com empenho para a concretização do objectivo de classificar a Arrábida como património mundial pela UNESCO.

A classificação da Arrábida como Património da Humanidade é essencial para a preservação do importante património natural, das actividades humanas tradicionais e culturais e contribui decisivamente para o desenvolvimento económico, social, cultural e ambiental da Península de Setúbal e do País.

Nestes termos, e tendo em consideração o acima exposto, ao abrigo da alínea b) do Artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do número 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República manifeste o seu apoio à Candidatura de Arrábida a Património Mundial Misto junto da UNESCO e adopte a seguinte:

Resolução

A Assembleia da República, manifestando o seu apoio à candidatura de Arrábida a Património Mundial Misto junto da UNESCO, recomenda ao Governo, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, a adopção das seguintes medidas:

– Apoiar institucionalmente a Candidatura de Arrábida a Património Mundial Misto junto da UNESCO, empenhando-se na sua aprovação e reconhecer a Arrábida como valor excepcional, que científico, cultural, histórico e paisagístico, que interliga a natureza com as actividades humanas tradicionais, pelas suas características naturais, a biodiversidade, os aspectos geológicos, o parque marinho e pelo seu património cultural material e imaterial

– Apoiar de acordo com as suas possibilidades, a Comissão Executiva da Candidatura de Arrábida a Património Mundial.

Assembleia da República, 22 de Julho de 2010

Os Deputados,

PAULA SANTOS; FRANCISCO LOPES; BRUNO DIAS; MIGUEL TIAGO; RITA RATO; JERÓNIMO DE SOUSA; JOSÉ SOEIRO; ANTÓNIO FILIPE; JOÃO OLIVEIRA; BERNARDINO SOARES; JORGE MACHADO; HONÓRIO NOVO

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