Dinastias

Dinastias

Os apelidos dos dirigentes políticos gregos são os mesmos, sensivelmente desde o fim da Segunda Guerra Mundial, mais precisamente desde o fim da Guerra Civil da Grécia (1946-49), com o interregno da Ditadura dos Coronéis (1967-74). As famílias Papandreou e Karamanlis (mas também Venizelos e poucas outras) dominam a cena política desde esses tempos e já vão na terceira geração no Poder, oscilando entre o centro-direita da “Nova Democracia” e o centro-esquerda do PASOK (Partido Socialista Pan-helénico), tal como Onassis e Niarchos dominavam as frotas comerciais. Trata-se de autênticas dinastias.

Ora, por muitas semelhanças que possamos ter com os gregos (e estamos a ver-nos como eles), neste particular somos muito diferentes, a nossa idiossincrasia “cultural” nunca permitirá a constituição de dinastias políticas.

Poderá pensar-se que por bons motivos, em nome da “ética republicana”, para impedir o nepotismo, o compadrio e o caciquismo que tal situação acarreta como uma fatalidade. Nada disso, tirem o “cavalinho da chuva”, o que se passa é que somos demasiado invejosos para permitirmos tal coisa. Nisto somos muito mais “gregos” do que os próprios gregos, mas assim mais para o “clássico”, evocando um tirano da Grécia Antiga, o ateniense Pisístrato (600-528 a.C.) que adoptou a famosa “doutrina da seara”, que consiste mais ou menos nisto: quando numa seara, uma espiga se eleva acima das demais, o melhor é cortá-la cerce. Na verdade, só por acaso ou por distracção deixamos alguém subir muito alto e quando isso acontece foi por que escapou à vigilância da comunidade (que entretanto só costuma funcionar como tal para coisas como estas). Dizemos logo que “se está a pôr em “bicos de pés”: “fogo nesse gajo (ou “gaja)”, mas “quem é que ele pensa que é afinal?”; “Por quem se toma?” Isso é que era bom!”

Se for filho de algum político conhecido, pior um pouco, pois ao sujeitar-se a escrutínio público, seria melhor estar quieto (Ai o “filho do papá”, ou o/a “menino/a da mamã” ou “onde é que o bebé acha que vai?”).

Que o diga João Soares por exemplo, nunca liberto pela sociedade portuguesa da enorme “sombra” tutelar do pai. Já onde as coisas são feitas mais por “debaixo dos panos” – empresas públicas, alta burocracia estatal, forças armadas, universidade, etc.. Aí já “filho de peixe” costuma “saber nadar” e as dinastias vão-se perpetuando sonsa e discretamente, sem que “ninguém” dê por isso. A propósito e apenas como exemplo: Sabem qual é o apelido do senhor que agora deu posse aos membros do Governo?

Pereira Coutinho. O mesmo apelido dos outros senhores, que deram posse aos outros membros dos outros Governos do 25 de Abril a esta parte.

Aquilo que na política e no meio artístico, ou seja nas áreas que têm exposição pública e mediática é um “carrego”, em meios mais “discretos” (ou “secretos”) pode ser uma “bênção” e não depender em nada do talento. Como, aliás, se comprovou num dos últimos “Prós & Contras” de Fátima Campos Ferreira, em que um dos jovens apresentados como tendo “furado o cerco” do desemprego de jovens licenciados em Portugal e até botou discurso dizendo umas inanidades sobre a “autoconfiança” e mais umas quantas balelas, é, tão só, filho do sócio maioritário de uma das maiores sociedades portuguesas de advogados.

Henrique Santana, filho do grande Vasco Santana, há uns quarenta anos, na velha RTP, acabou por “explicar” esta situação:

“Quando Vasco Santana era pequeno e saía com o pai, que se chamava Henrique, os transeuntes comentavam: Lá vai o Henrique Santana com o filho; quando Vasco Santana se tornou um actor conhecido e saía com o pai já se dizia : Olha, lá vai o Vasco Santana com o pai. Ora de mim nunca ninguém disse: Lá vai o Henrique Santana com o pai; mas sempre mesmo muito depois de adulto: Lá vai o Vasco Santana com o filho”.

Por essas e por outras é que quando perguntavam ao meu querido pai “Como se chama?” Ele costumavam responder:

“Não me chamo. Chamam-me João”! 

António José Carvalho Ferreira

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