A Quadriga

A Quadriga

Acaba de ser firmado entre o Governo, o Patronato e uma Central Sindical – que parece existir apenas para isso, afinal os “amigos” são para as ocasiões – um acordo de “concertação” social que deixa os trabalhadores muitíssimo desconcertados. É uma espécie de retorno à escravatura por via legislativa, numa “janela de oportunidade” induzida pela “crise” do capitalismo de casino, nas cinzas recentes da sua propedêutica: o legado de Sócrates e da sua desastrosa governação de “esquerda” (“vai lá, vai”…).

Este “acordo” visa formalizar um retrocesso civilizacional de dimensões ciclópicas em termos sociais, uma vez que as medidas de natureza “económica” não passam de um mero álibi, os custos do trabalho não são dos que mais pesam na efectiva falta de produtividade, são-no sim a deficiente gestão, a desorganização, a falta de formação, sobretudo dos “patrões”, os altíssimos custos da energia e dos combustíveis, a corrupção, as “habilidades” e o “chico-espertismo”, para além de outros encargos que irão ainda agravar-se. A verdade é que era preciso pôr o “pagode” na ordem, nesta “nova” ordem que é idêntica, mas em versão sonsa (toma lá que é “democrático”), à que vigorou antes da “primavera” marcelista (“o respeitinho é muito bonito”). Trata-se de medidas de carácter “disciplinar” – é preciso mostrar “quem manda” e quem tem de ir “comer à mão” de quem. São, portanto, vexatórias e de condicionamento só do lado do “pau”, a crueza dos tempos dá para dispensar a “cenoura” e destinam-se a deixar aberta uma imensa “zona de conforto” em exclusivo para o Capital através da pilhagem dos salários e de todo o tipo de direitos, o que se traduz na precarização das relações contratuais até ao nível da “praça de jorna”, desta feita em versão electrónica.

Vai tudo a eito – o que foi arduamente conquistado – as férias, os feriados, os sábados, os fins-de-semana, as horas extraordinárias (que em grande parte já foram), um mínimo de segurança e estabilidade (que também já era), tornando os trabalhadores absolutamente descartáveis. Tudo isto com algumas “originalidades” pícaras como aquela do Estado (ou quem o representa, neste caso o Governo) negociar com a Igreja os feriados a suprimir e terem acordado no “fifty-fifty” (dois para cada lado, entre os quais o 15 de Agosto, como se sabe, um mês muito “produtivo”). Agora que o “Acordo” fala na possibilidade de serem “apenas” três, a Igreja “ameaça” não “ceder” nenhum.

Confesso que já sabia que o Governo não mandava em Portugal, mas estava convencido que era a “Troika”, nunca pensei que fosse uma “Quadriga”.

Cá para mim, a avaliar pelas provas dadas na estranja pela excelente mão-de-obra portuguesa, enquanto por cá uns continuarem a fingir que pagam, os outros hão-de continuar a fingir que trabalham.

O meu pai que veio para Lisboa nos anos 50, contou-me que um Ministro das Corporações, de ideias mais “arejadas”, falou a Salazar na possibilidade da introdução da “semana-inglesa” (não trabalhar nas tardes de sábado, a “semana-americana” é a folga total). O homem de Santa Comba terá respondido:

– “Folga só ao domingo e mesmo assim – de manhã missa, à tarde futebol”!

Apesar de ambas as “semanas” terem vindo, à vez, a acontecer, nalguns casos até antes do 25 de Abril, e para desconsolo da Igreja, neste “filme” em “reprise” só deverá ter viabilidade o “programa” da parte da tarde.

António José Carvalho Ferreira

 

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