De Caravela pelo mundo a Caixote do lixo!

De Caravela pelo mundo a Caixote do lixo!

Vai longe o tempo das caravelas portuguesas dominarem os mares nunca dantes navegados e dobrarem os cabos oceânicos até paragens longínquas. Senhores do mundo. Quinhentos anos em terra, a caravela portuguesa, navegando no mercado tormentoso, mete água por todos os buracos da nau económica descapitalizada por finanças especulativas transnacionais.

Arte capitalista que no éter instantâneo da Via-Láctea financeira se propaga pelo planeta sob a forma de linhagem financeira que supostamente favorece as populações com o maná de empregos que dizem criar, que nunca surgem.

No século XX, patrões, directores, empregados e operários das empresas, deslocavam-se dentro das fábricas, de um lado para outro, cada um com a sua missão, conheciam-se. Sabia-se onde o labor se processava, onde se produzia e o quê, as matérias-primas que se manipulavam, por onde circulava a produção, quem respondia por cada missão e pela obra a seu cargo. Conhecia-se quem ordenava e comandava as operações. Entendíamo-nos no nosso idioma, na nossa linguagem expressávamos as nossas insatisfações e protestos. Sabia-se de onde vinha a exploração, como e porquê as razões da luta social. Vivíamos todos dentro do mesmo mundo. Esse universo está hoje diluído num modelo onde proliferam multinacionais, transnacionais, liberalismo total, mundialização desregulada sob o domínio de potências distantes, fantasmas que sentimos mas não vemos, inabordáveis, insensíveis, volatilizam-se noutras esferas, manipulam produtos virtuais, movimentam activos financeiros convertidos em riqueza mesmo antes de se tornarem reais.

Forjam símbolos sociais, mas não querem sistema social nem Estados que protejam a segurança social. Abrem caminho para outra era à velocidade do instante. Comandam as finanças por cima das fronteiras, ignorando povos e Governos nacionais. Império que dissipa o mercado do trabalho. Monta a dívida soberana com juros incomportáveis, prestamista que impõe classificações e notações desconformes, agiotagem desbragada às frotas de Portugal e outros países periféricos que navegam neste oceano hegemónico da economia privada, anónima, em redes cruzadas e à escala planetária, escapando às vagas populares que levantam a voz, mas por onde flutuam não lhes chega o som. Sem ligações emocionais esmagam quem se lhe opõe no pressuposto de que tratam da economia, um bem para todos, que os resultados contradizem. Redes financeiras privadas e mundializadas dominam os Estados Nacionais, controlam e comandam as instituições dos países através de organizações financeiras, Banco Mundial, Fundo monetário internacional e agências de notações.

Este poder volátil prepara o mundo para um novo paradigma onde um indivíduo sem funções deixa de ter lugar na sociedade. Dizimadas as actividades laborais, o estatuto de humano sofrerá alterações que poderão desfazer os direitos associados à pessoa humana.

Entoam loas à flexibilidade do trabalho e esfarrapam as leis da concorrência, da competitividade, moldam as regras económicas de interesses draconianos que não são mais nem menos do que a degradação da actividade laboral, desvalorizando o trabalho, semeando a pobreza.

O imposto extraordinário que o Governo português anunciou, depois de o Primeiro-ministro garantir não haver mais impostos sobre o Povo, é uma cópia da agiotagem do mercado, tirar aos pobres para dar aos ricos. Um murro no estômago, disse ter sentido, a propósito da avaliação da Agência de Rating Moody”s depois de esta colocar Portugal no lixo das economias mundiais. Se o sentiu agora, que dirá a grande massa popular que leva tareias há longos meses, todos os dias, muitos já nem forças têm para uma leve palmada, vivem da caridade que os que por dentro deste jogo violento neoliberal jogam com falsas piedades tanto acarinham.

Ficar mais solto, menos preso a redundâncias é prepararmo-nos no campo do pensamento, da análise real. Pensar é o acto humano mais precariamente distribuído no mundo das inteligências, tornando os povos reféns dos que dominam pensando por linhas tortas. Vamos pensar por linhas rectas e agrupar forças para acautelar o futuro lutando para inverter o rumo neoliberal.

 

Carlos Alberto (Carló)

Julho de 2011

 

 

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