Aumento do horário cria condições para o despedimento de mais de 183.00 trabalhadores

Aumento do horário cria condições para o despedimento de mais de 183.00 trabalhadores

No estudo que envio analiso as consequências do projecto de lei do governo apresentado na Assembleia da República com o objectivo de aumentar o horário semanal dos trabalhadores por conta de outrem em 2,5 horas, sem direito a qualquer retribuição, e procuro também desmontar as justificações apresentadas pelo governo, e constantes do próprio projecto lei, que o aumento do horário semanal criará emprego, aumentará a competitividade das empresas, e determinará a recuperação economica do pais

A titulo apenas informativo junto um texto-resumo sobre a tese de doutoramento com a designação “Grupos económicos e desenvolvimento em Portugal no contexto da globalização” que entreguei no ISEG. Quando forem marcadas as provas do doutoramento informarei para o caso de ter interesse em assistir.

RESUMO DESTE ESTUDO  

O aumento do horário semanal dos trabalhadores por conta de outrem a tempo completo determinaria 315,7 milhões de horas a mais de trabalho gratuito. Em remunerações não pagas corresponderia a 1.761 milhões € que os trabalhadores não receberiam. O aumento do horário semanal em 2,5 horas determinaria a redução em 5,9% do valor hora, o que significaria que todos os trabalhadores passariam a receber menos pelas horas extraordinárias que fizessem e em todas as remunerações que fossem calculadas com base no valor hora. O aumento do tempo de trabalho anual em 315,7 milhões de horas criaria condições para que mais de 183.000 trabalhadores pudessem ser considerados “excedentários pelos patrões, dando origem a dezenas de milhares de despedimentos. E isto porque se dividirmos aquele total de horas a mais – 315,7 milhões – pelo número de horas que, segundo o Eurostat, se trabalha em média por ano em Portugal que é 1719 horas antes do aumento (na Alemanha, segundo o mesmo Eurostat, apenas se trabalha, em média, 1.655 horas/trabalho/ano, e os trabalhadores portugueses são acusados por governantes da Alemanha de trabalharem pouco), obtém-se 183.704, que corresponde ao número de trabalhadores que podiam ser considerados “excedentários” pelos patrões, ou seja, com menos 183.704 trabalhadores as empresas teriam ao seu dispor, com o aumento do horário semanal em 2,5 horas, o mesmo tempo de trabalho para produzir que têm actualmente, e muitos milhares seriam despedidos. O maior problema das empresas neste momento não é produzir mais, mas sim conseguir vender o que já produzem actualmente, pois com a redução significativa do poder de compra da população e maiores dificuldades em exportar vendem cada vez menos.

A “norma tampão” constante do projecto do governo PSD/CDS é uma autêntica burla e visa enganar jornalistas e a opinião pública. Segundo essa norma (nº2 do artº 8º do projecto), o empregador para poder aumentar o horário de trabalho teria de manter o emprego liquido. No entanto, o projecto considera que apenas o despedimento colectivo e por extinção do posto de trabalho é que contam para a redução do emprego liquido. Portanto, o despedimento de trabalhadores contratados a prazo ou com qualquer outro tipo de contrato não entram no cálculo da redução de emprego liquido. Por outro lado, e segundo também nº3 do mesmo artigo, a redução do emprego determinada por despedimentos colectivos ou por extinção do posto de trabalho pode ser compensado pela admissão de trabalhadores com qualquer tipo de contrato, incluindo os contratados a prazo, que se forem despedidos depois não entram, segundo o projecto, para o cálculo de redução do emprego liquido. Assim, empresas como Jerónimo Martins, Sonae, e Autoeuropa, que têm centenas de trabalhadores contratados a prazo ou temporários podem, segundo o projecto do governo, aumentar o horário de trabalho semanal em 2,5 horas de todos os trabalhadores e, depois, despedir uma parte de trabalhadores a prazo ou temporários que considere excedentários, pois estes não entram, se forem despedidos, para o cálculo do emprego liquido segundo a definição que consta do projecto de lei do governo PSD/CDS    

O governo afirma no seu projecto de lei, que o aumento do horário de trabalho “visa contribuir para a recuperação da economia promovendo a competitividade e o crescimento das empresas e a criação de emprego”. Relativamente à criação de emprego já mostramos que aconteceria precisamente o contrário. Em relação ao aumento de competitividade e recuperação da economia sucederia o mesmo. O aumento do horário semanal do trabalho determina uma redução, em média, de 5,9% no valor hora. Como os custos salariais das empresas representam entre 15% a 30% dos custos totais (varia de empresa para empresa), isso acarretaria que aquele aumento determinaria um redução nos custos totais entre 0,9% e 1,8%. Portanto, não é com reduções desta dimensão que se aumentará a competitividade das empresas portuguesas. Este governo insiste num “modelo de desenvolvimento” esgotado e onde Portugal não tem quaisquer possibilidades em competir – modelo baseado em baixo salários – como países como a Índia, a China e mesmo os países do leste da Europa. Para além disso, ao reduzir o poder de compra da população através quer do aumento do desemprego quer por meio da diminuição dos rendimentos só poderá dificultar a recuperação económica prolongando e tornando mais profunda a crise.

Finalmente, o aumento do horário de trabalho e a imposição pelo governo de trabalho gratuito determinaria o aumento da conflitualidade e da desmotivação a nível das empresas. E isto ainda mais quando todos os sindicatos já afirmaram que irão resistir a este retrocesso civilizacional. Em Portugal, como é conhecido, a conquista do horário semanal de 40 horas só foi conseguido com muitas lutas dos trabalhadores e só depois é que foi consagrado em lei. Para além disso, causará, por aumento do cansaço do trabalhador devido ao alargamento da jornada de trabalho e à insatisfação, mais sinistralidade, mais doenças profissionais, e mais defeitos na produção. Esta medida só poderá ser interpretada como a intenção deliberada deste governo de ultra-direita em agravar a saúde e a conflitualidade, em aumentar a exploração e as desigualdades no país.

  Eugénio Rosa

Economista

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