O discurso feito por Cavaco Silva na tomada de posse como presidente da República é um discurso contraditório e ambíguo. Por um lado, afirma que “sem crescimento económico a consolidação orçamental é insuportável” e que “há limites para os sacrifícios que se podem exigir ao comum dos cidadãos”, mas, por outro lado, que é “crucial diminuir o peso da despesa pública e reduzir a presença excessiva do Estado na economia”, ou seja, que é necessário cortar nas despesas com as Funções Sociais, pois constitui 66% da despesa total do Estado sem impostos e privatizar ainda mais (o pouco que resta).O governo de Sócrates aproveitou logo a “deixa” para apresentar um conjunto de medidas que, se forem implementadas, determinariam mais sacrifícios para os portugueses e maior recessão económica.
Para concluir isso, basta ter presente que, entre Jun2010/Jan2011, o numero de desempregados a receber subsídio de desemprego diminuiu em 58.813; o numero de crianças a receber abono de família baixou em 391.777; e que o numero de beneficiários do RSI reduziu-se em 62.752. No Orçamento da Segurança Social de 2011, estão orçamentados para subsidio de desemprego este ano menos 156 milhões € do que em 2010; para abono família menos 218 milhões €; e para RSI menos 120 milhões €; portanto, ao todo menos 494 milhões €.. E como tudo isto já não fosse suficiente uma das medidas anunciadas por Sócrates é precisamente “Redução adicional da despesa com prestações sociais e aumento das contribuições sociais” . É evidente que tal medida, se for implementada, lançaria muitas mais famílias para a miséria.
Nas medidas anunciadas pelo governo, existem três que atacam directamente os reformados e aposentados. A primeira, que afectaria todos os pensionistas da CGA e da Segurança Social é o congelamento das pensões também em 2012 e 2013. A segunda medida que afectaria cerca de 750.000 pensionistas (350.000 da CGA e 400.000 da Segurança Social) é diminuição do rendimento anual dos pensionistas isento de IRS, que passaria dos actuais 6.000€ para apenas 3.888€,o que determinaria que a diferença de 2.112 €, que até aqui está isenta de pagamento de IRS, passasse a estar sujeito a IRS, aumentando a carga fiscal.. Finalmente, a terceira medida é um corte entre 3,5% e 10% no valor nominal das pensões de valor superior a 1.500€/mês, à semelhança do que foi feito nas remunerações da Função Pública. Se esta medida for aplicada seriam afectados 260.000 pensionistas, 140.000 da CGA e 120.000 da Segurança Social.
Uma outra medida contida no pacote divulgado pelo governo, é a intenção deste em aumentar novamente os impostos para aumentar a receita fiscal em 0,9% do PIB (+1.620 milhões €) em 2012, e em 0,4% do PIB (+720 milhões €) em 2013. Para obter isso pretende: (1) Rever e limitar os benefícios e deduções fiscais em sede de IRS (volta de novo a intenção de reduzir, a partir do 2º escalão de IRS, os benefícios fiscais relacionados com despesas de saúde e educação); (2) Racionalizar a estrutura das taxas de IVA, o que significa ou eliminar a taxa reduzida de 6% e a intermédia de 13% ficando apenas a taxa de 23% ou então passar produtos dos grupos sujeitos a taxas de IVA de 6% e 13% para o grupo sujeito a taxa de IVA de 23%. O governo pretende aumentar ainda mais os impostos específicos sobre o consumo (tabaco, produtos petrolíferos, bebidas alcoólicas, imposto automóvel, etc). E pretende reduzir a despesa pública em 2011 em mais 1.360 milhões € à custa de reduções no SNS, no SEE, nos apoios sociais, e no investimento.
O governo tenciona também reduzir as indemnizações pagas pelas empresas quando despedem de um mês de salário por cada ano de serviço para apenas 10 dias de salário, e introduzir o limite máximo de indemnização em caso de despedimento de 12 meses, mesmo que o trabalhador tenha mais de12 anos de serviço. Segundo um estudo do Ministério do Trabalho de 2010 – “Emprego, Contratação Colectiva e Protecção em Portugal” -a média de destruição de empregos em Portugal durante o ano de 2009 foi de 154.501 empregos por mês (pág. 148) e a duração média dos contratos a prazo é de 2 anos e os por tempo indeterminado de 13 anos (pág. 137). A redução da indemnização, como pretende o governo, determinaria um ganho mínimo extraordinário para os patrões que estimamos em 2.270 milhões €/ ano. E isto tomando como base contratos de 2 anos, mas os por tempo indeterminado atingem em média 13 anos. Eis uma forma como governo pretende reduzir os custos do trabalho à custa dos desempregados.
O governo pretende reduzir as transferências para o SNS (o que provocaria degradação dos serviços); para as empresas públicas de transportes colectivos (o que determinaria aumentos dos preços dos transportes públicos); pretende também cortar ainda mais no investimento público. Estamos perante um programa que, ao provocar um aumento significativo dos impostos e uma redução tão grande no consumo e no investimento público (12.875 milhões €)., agravaria ainda mais as condições de vida da maioria dos portugueses e atiraria o País para uma recessão económica ainda mais profunda e prolongada. E Passos Coelho diz que é preciso que o “PS continue a fazer o seu trabalho”, o que significa que faria o mesmo ou pior.
Eugénio Rosa
Economista
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