DA GUERRA NUNCA SE VOLTA ! 7. A COLONIZAÇÃO DE MOÇAMBIQUE

DA GUERRA NUNCA SE VOLTA ! 7. A COLONIZAÇÃO DE MOÇAMBIQUE

NOS 50 ANOS DA GUERRA COLONIAL

[ PARA A HISTÓRIA DO COLONIALISMO PORTUGUÊS

7. A COLONIZAÇÃO DE MOÇAMBIQUE

Por volta de 1667, os europeus haviam-se apoderado de grandes áreas até Tete e territórios circundantes. A coberto das suas armas de fogo, comportam-se como malfeitores, procurando enriquecer pela simples pilhagem, como refere Basil Davidson, na obra já referida, editada em 1960 : …” A responsabilidade cabe ao seu antiquado sistema social. Como lhes faltava uma sólida classe mercantil, os colonos portugueses pouco mais sabiam fazer que pilhar e conquistar. Permaneceram sempre fora da grande corrente da democracia mercantil, os seus métodos de governo, rigidamente autocráticos, viriam a ditar a ruína, não só deles próprios como de todos os povos que conquistaram. O génio individual que punham nas suas empresas, a coragem, espírito de invenção e capacidade de adaptação que tantas vezes demonstraram, foram repetidamente anuladas pela estupidez das suas instituições. Deparando no Sudoeste africano com povos confiantes e prósperos, fortes pela dinâmica de uma civilização própria em curso de evoluir, os ocidentais degradaram-na gradualmente até os despenhar na mais negra miséria”.

Mas existiu de facto tal civilização?

O período que decorreu entre os anos 500 e 1500 da nossa era, foi, segundo a documentação histórica, o milénio de máxima actividade comercial entre a África Oriental e as potências marítimas do Oceano Índico, e também do máximo desenvolvimento das culturas da idade do ferro ao longo da orla costeira. os seus habitantes falavam swahili e  embora não tivessem escrita, vários autores árabes deixaram contada a sua grandeza.

Os seus vizinhos do interior de língua banto, a que os swahili davam o nome genérico de Wa-Nyica (donde derivaria mais tarde Tanganika ), podem ter sido originalmente do tipo negróide, ou mais provavelmente uma mistura de vários tipos africanos miscigenados com os povos conquistadores do Norte. Mas tratava-se inequivocamente de um povo puramente africano, que possuía inegavelmente a tecnologia da idade do ferro e vivia num sistema tribal-feudalista.

E o que fizeram afinal os portugueses, glorificados descobridores, no primeiro século e meio de ocupação?

Citamos Basil Davidson, na obra já referida :…”Depois de se terem apoderado dos portos comerciais da Índia e de África e de os terem arruinado pela estupidez das ordens reais e pela cupidez dos aristocratas, destruíram cegamente toda a rede subtil de interesses comerciais, tecidos laboriosamente durante séculos de uma ponta a outra do Oceano Índico (…) tendo depois verificado que a sua reestruturação era tarefa acima das suas forças, lançaram-se desesperadamente à procura do ouro ; quando este lhes começou a faltar começaram a procurar prata ; quando esta faltou também, lançaram-se em busca de qualquer coisa que lhes desse lucros rápidos, acabando por se contentar com o comércio de escravos”.

O regime dos chamados “prazos “ foi instituído nos finais do século XVI, e consistia no arrendamento pelo estado de terras expropriadas aos nativos, obrigados a trabalhar nelas como escravos. O relativo malogro desta experiência  de colonização agrícola e militar e a descoberta dos campos auríferos e diamantíferos no Brasil, fizeram com que caísse a ruína económica em Moçambique. A situação só animou nos meados do século dezassete, quando foi incrementado o tráfico de escravos, fundamentalmente para as terras de Vera Cruz, e foi criada a junta do Comércio para explorar esse monopólio.

No final do século XVII, princípios do século XVIII, o comércio de escravos descambou tristemente para um tráfego desenfreado de carne humana, estando na mão dos prazeiros poderosos e prosperando na Zambézia e nos centros populacionais de Sena e Tete. O Brasil viria a conferir à presença dos portugueses no Sudeste Africano um significado mais permanente, mas aqui reside o ponto mais triste de toda a história, pois aqueles só queriam de África um único artigo – trabalho escravo!

Durante a segunda metade do século XVIII, Moçambique era um território arruinado, separado definitivamente da dependência da Índia com a criação em 1752 da Companhia  Geral de Moçambique. O compromisso assinado pelo governo português em 1815, no Congresso de Viena, para a futura abolição da escravatura, foi um golpe rude no rotineiro comércio de escravos para as costas orientais do Atlântico. Entretanto a Revolução Liberal de 1820, enxameou as colónias de deportados políticos, situação propícia à ideia separatista da confederação brasileira, formada por Angola, cabo Verde, Moçambique e Brasil, mas na Zambézia, dominada pela aristocracia sertaneja dos  senhores dos prazos, a ideia foi repudiada e não vingou.

Por esta época travam-se lutas sangrentas com os nativos ( destruição de Lourenço Marques em 1833 pelos cafres ), e com os próprios  capitães-mores dos prazos, no intuito da unificação do território (a principal foi contra Bonga, capitão-mor e senhor do prazo de Massangano). As pequenas colónias de portugueses no interior, eram varridas e destroçadas pelas mesmas invasões Nguni, ( Zulus vindos do Sul ), que sobrepujaram as cidadelas históricas de Khani e Dhlo-Dhlo e as fortalezas de Inyanga e Penhalonga, na Rodésia.

Como testemunho do ódio e do desânimo  inculcados pela penetração europeia no planalto africano, conta-nos Bryant : “ Em 1860, Mzila, chefe-guerreiro dos invasores zulus, para evitar que as minas de ouro de Manica (onde outro chefe  zulu, Mxaba, à sua passagem tinha exterminado todos os portugueses!), viessem jamais a constituir um atractivo tentador para outros aventureiros de pele branca, fez com que todos os potenciais trabalhadores indígenas daquela zona fossem sumariamente executados, transformando num deserto essa vasta região de Moçambique”.

Seria nesta aridez que outros europeus viriam a penetrar nos fins do século XIX, não é de admirar pois, terem imaginado diante dos seus olhos não o resultado de ontem, mas que assim permanecera em completa desolação desde os princípios dos tempos.

Bibliografia:

– Davidson, Basil, “Revelando a velha África”, Prelo, Lisboa, 1968

– O Colonialismo Português, Trabalho de Seminário  de Estudo,

ISEconomia, Lisboa ;, 1970

Armando Sousa Teixeira

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