“ Nesses países não há que colonizar, há que explorar!”- afirmava o historiador Oliveira Martins no século XIX.
O processo seguido na colonização de Angola, foi diferente daquele utilizado no Brasil ou nas Ilhas Adjacentes, onde se seguiu o regime das Capitanias, autênticos feudos em terras pouco povoadas. Em Angola, porém, havia muitas regiões habitadas, onde diferentes povos ocupavam o território sob regimes de produção tribal/feudal, onde não faltavam os braços para trabalhar a terra.
Os factores que atraiam os portugueses em África, estavam relacionados com o comércio, mas faltavam-lhes produtos para as populações os aceitarem bem. Em Portugal não se fabricavam tecidos em quantidade suficiente, como faziam os ingleses e franceses, que por isso conquistaram o mercado africano no século XVII. Restavam os conhecimentos e a experiência de navegação, e foi através dos transportes marítimos que os portugueses ganharam a sua entrada nesse mercado, sobretudo após a fundação de Luanda em 1576.
Até esta data interessava qualquer actividade económica proporcionando lucros, mas estes eram escassos e, por isso, a partir daquela altura operou-se uma significativa mudança política. Desencadearam-se então processos militares de ocupação para impor suseranias e instituir um sistema de tributos em que os chefes tradicionais vencidos ficavam obrigados a prestar toda a assistência e a pagar impostos aos capitães do exército conquistador.
No século XVII, o pagamento de tributos ao governo militar era feito em escravos e a escravatura passou então a ser o aspecto mais importante do comércio em Angola. Mais que o sal, o cobre, o ferro ou o marfim , produtos tradicionais de exportação, o tráfico de escravos passou a ser a actividade quase exclusiva.
O esclavagismo em Angola, tal como em Moçambique em menor escala, está intimamente ligado à colonização do Brasil. A extraordinária produção das culturas exóticas e a descoberta dos jazigos mineiros, constituem o móbil da exploração dos sertões das terras de Vera Cruz. O problema que se punha às forças colonizadoras imperiais era a necessidade de mão de obra em abundância e barata, e é este o verdadeiro significado da escravatura moderna, condição necessária e indispensável para a introdução do modelo de produção capitalista no Brasil.
A organização do tráfico de escravos, ligada à ascensão da burguesia comercial portuguesa, foi feita aproveitando a sua “aceitação” pelos povos africanos. Constituíram-se verdadeiros exércitos especializados nos “raids” de caça, causando profundas transformações na estrutura social e política autóctone, minando o sistema tradicional. Agora não são só os cativos, como também os homens livres, a serem arrancados violentamente à sociedade de origem e exportados como máquinas de trabalho.
Segundo Basil Davidson, o progressivo alastramento do comércio de humanos, foi a causa directa da desagregação social africana. Textualmente : “ Não há dúvida que havia escravos antes da chegada dos brancos (…) Mas depois do alargamento do tráfico esclavagista, a posse de escravos transformou-se numa caça ao homem, verdadeiramente selvagem. Não só os mais fortes vendiam os mais fracos, mas até os laços de família se quebravam e os pais vendiam os filhos, ou os filhos os pais, como objectos sem valor aos mercadores portugueses, que os marcavam com um ferro quente como quem marca carneiros”.
De 1486 a 1641, foram “exportados” de Angola, 1 839 000 negros, uma média de 12 000 por ano. Na primeira metade do século XVII, a exportação atingiu 15 000 “peças da Índia “ anuais (nome pelo o qual se designavam os servos africanos) e posteriormente veio a aumentar.
Davidson conclui de forma meridiana : “ O tráfico de escravos contribuiu para a degenerescência do pensar e do agir, tanto dos africanos como dos europeus, ao criar atitudes enraizadas de desprezo pela vida humana que duraram gerações”.
Bibliografia :
– Davidson, Basil – “Revelando a velha África”, PRELO, Lisboa,
1968.
– O colonialismo Português – Angola, Seminário de Estudo, ISE,
Lisboa, 1970
– Oliveira Martins, Joaquim Pedro de -” O Brasil e as Colónias
Portuguesas“,1880
Armando de Sousa Teixeira
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