PARA A HISTÓRIA DO COLONIALISMO PORTUGUÊS – 12. LUANDA: 4 DE FEVEREIRO DE 1961

PARA A HISTÓRIA DO COLONIALISMO PORTUGUÊS – 12. LUANDA:  4  DE  FEVEREIRO DE 1961

“Ivuenu, ivuenu, turutuka dii…” (oiçam, oiçam, voltaremos aqui!…). A canção dos nacionalistas insurrectos que estiveram no“ Levantamento de 4 de Fevereiro de1961”, em Luanda, encerrava a mensagem premonitória da vitória final, e era um grito de revolta contra a política colonialista portuguesa e o cortejo espantoso de crimes de quatro séculos de dominação.

Os patriotas angolanos, Neves Bendinha, Paiva Domingos da Silva, Domingos Manuel Mateus, Imperial Santana, Raul Deão, Virgílio Francisco, Bento António e Agostinho Cristóvão, à frente de cerca de 220 homens armados com catanas, tinham a perfeita consciência das poucas ou nulas hipóteses de êxito contra a Polícia e a Tropa armada de espingardas, mas decidiram avançar com as acções revolucionárias que dariam a conhecer ao mundo o drama do povo angolano.

As notícias chegadas a Luanda sobre os bárbaros bombardeamentos com “napalm”, perpetrados pela Força Aérea Portuguesa sobre os camponeses revoltados na Baixa do Cassange, fazendo milhares de vítimas, (houve um piloto que se recusou e foi liminarmente afastado da ForçaAérea); a informação de que os presos políticos do chamado “Processo dos Cinquenta”, iriam ser transferidos para o Campo de Concentração do Tarrafal, na Ilha de Santiago, em Cabo Verde; sobretudo a presença em Luanda de dezenas de jornalistas estrangeiros, na expectativa de ver chegar o paquete “Santa Maria”, que Henrique Galvão havia tomado e rebaptizado de “Santa Liberdade”, denunciando ao mundo o regime fascista e colonialista de Salazar, levaram os revoltosos a decidirem avançar em acções de grande bravura e sacrifício colectivo.

Contavam com o apoio espiritual de monsenhor Manuel Joaquim das Neves, um cónego mestiço angolano, missionário na arquidiocese de Luanda, que embora considerasse a acção prematura e mal preparada, abençoou os revoltosos, certamente por considerar que era a altura de denunciar, “…a política colonial portuguesa de superexploração e terra queimada”. De resto, o próprio, tinha promovido e apoiado materialmente a aquisição dos fardamentos e das catanas guardadas no campanário da Sé Catedral.

Na madrugada de 4 de Fevereiro, enquadrados em vários grupos, os insurrectos atacaram os vários pontos previamente delineados:

   Emboscada  a   uma   patrulha  da  Polícia  Móvel  no  bairro  de Sambizanga (foram mortos 4 polícias);

   Assalto  à  Casa  de  Reclusão  Militar,  junto à  praia  do Bungo onde estavam muitos presos políticos;

  Assalto    ao    aeroporto    Craveiro    Lopes   (comandado  pelo próprio Bendinha);

  Ataque à cadeia  da  Administração  Civil (PIDE) no bairro de São Paulo;

   Ataque à cadeia da 7.ª esquadra da PSP (estrada de Catete);

   Ataque à companhia Móvel da PSP (4ª esquadra);

   Assalto à companhia Indígena;

   Tomada da emissora   Oficial  de  Angola  e  Estação  dos  Correios (bairro dos correios).

Nenhum dos objectivos foi alcançado. Foram mortos 7 polícias portugueses e morreram nos assaltos dezenas de autóctones, sendo os restantes, com poucas excepções, feridos, presos, interrogados, torturados e eliminados pela PIDE no Forte de S. Pedro da Barra. A polícia política dizia não ter tempo para instruir os “processos legais”, abatia e pronto!

Logo no dia dos funerais dos polícias brancos, com milhares de colonos europeus no cemitério de Sant´Ana, começou a terrível “révanche”, com a perseguição, espancamento e morte de gente negra e indefesa, que seguia num machimbombo (autocarro), ou de trabalhadores de uma oficina perto.

Depois foi a vingança impune, levada a cabo por gente desvairada, por forças tresloucadas de ódio rácico e “empurradas” por facínoras profissionais. Correrias, espancamentos, mortes às dezenas, uma autêntica eliminação selectiva, digna de verdadeiros herdeiros dos esclavagistas e negreiros do passado:

 “Mata que é turra!”, “Agarra que é lumunba!” (referência ao grande sindicalista e dirigente angolês), “Mata esse preto, filho da puta!”, eram os gritos das turbas exaltadas durante o dia. À noite nos muceques, nas rusgas e cercos, era o genocídio étnico, deixando centenas de cadáveres, empurrados por “buldozers” logo de manhã para valas comuns.

Estava iniciada a Guerra Colonial, o mais terrível flagelo que ensombrou Portugal no século XX, dirigido por uma ditadura colonialista e fascista que não quis negociar a tempo o legítimo direito dos povos africanos à autodeterminação e independência.

Bibliografia:

  • Mota, Henrique – 4 de Fevereiro de 1961 – Angola, “ Avante! ”, Lisboa, 2005
  • Pacheco, Carlos – A rebelião de um sacerdote, “Público”, Lisboa, 3/5/2006

Armando Teixeira

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