“Primeira linha férrea ao sul do Tejo – como já nesta série de crónicas se recordou (Dez.° 1965) — foi inaugurada em1861, quando se estabeleceu a ligação ferroviária entre o Barreiro e Vendas Novas. A Estremoz chegou a via em 1873 e a Serpa em 1878, para o Algarve só conhecer o caminho-de-ferro em 1889. A progressiva vila do Barreiro é, portanto, há mais de um século, a testa de ponte das linhas meridionais do país.”
A primitiva estação do Barreiro era um vasto edifício situado junto à margem do rio, do lado do canal de Coina, a 1 quilómetro da vila, edifício que mais tarde foi aproveitado para instalação das oficinas gerais. Com uma plataforma comportando cinco vias para o movimento ferroviário, esta estação satisfazia o fim em vista, apenas com um senão. o acesso dos passageiros, vindos de Lisboa por barco, era deficiente e incómodo, uma vez que obrigava a percorrer a pé uma grande distância, havendo ainda que utilizar barcos mais pequenos, para se alcançar por fim a estação ferroviária. Foi este inconveniente, aliado ao desenvolvimento do tráfego de passageiro e de mercadorias, que exigiu a construção duma nova estação no Barreiro, à qual é consagrada a presente crónica, elaborada com elementos colhidos na completíssima obra O Barreiro Antigo e Moderno, de Armando da Silva Pais, em excelente edição da Câmara Municipal do Barreiro
Antevendo as dificuldades que encontrariam para lançar os sólidos fundamentos para a nova estação, visto o canal de Coina apresentar-se extraordinariamente lodoso, pensaram os técnicos em prolongar o caminho de ferro até Cacilhas, erguendo aí o projectado edifício. Então, o (salvador) do Barreiro, foi o Eng. Miguel Pais, técnico dos mais competentes da época, que (sonhou) com a construção da ponte sobre o Tejo e anteviu uma Lisboa mais bela e mais integrada no século que se avizinhava. Infelizmente, nem os nossos avós conheceram a ponte, nem nós conhecemos as arrojadas obras com que o grande idealista pensou transformar a fisionomia da capital. Mais sorte teve o Barreiro, pois o esclarecido engenheiro ofereceu-lhe uma nova estação. Oitenta e quatro anos vão passados.
O Eng. Miguel Pais ocupava o cargo de chefe de tracção e conservação de via e obras dos Caminhos de Ferro do Sul e Sueste. Estudara também o problema da construção da nova estação do Barreiro e afirmara que o edifício podia erguer-se em perfeitas condições, embora houvesse que enfrentar sérias dificuldades. Houve sorrisos dos incrédulos, mas o certo é que Miguel Pais foi encarregado de elaborar o seu projecto e apresentou-o em Março de 1876. A obra fora orçada em 280.000$000.Lançados os primeiros fundamentos hidráulicos sobre leitos de areia grossa, atravessando camadas de profundos lodos, os trabalhos, dirigidos por mão de mestre, foram prosseguindo satisfatoriamente, apesar da descrença de alguns técnicos nacionais e estrangeiros. A falta de verba, porém, foi a sombra negra de Miguel Pais, que viu as obras paralisadas durante um ano, até que essa dificuldade foi vencida e a nova estação pôde começar a tomar forma e feitio, erguida graciosamente à beira das águas do Tejo. As linhas arquitectónicas do edifício foram bastante elogiadas e houve até quem afirmasse que possuíam (reminiscências da arquitectura manuelina).
Dispondo duma gare com 80 metros de comprimento e 15 metros e meio de largura, a estação propriamente dita importou em cerca de 58 contos de réis, correspondendo mais de metade desta verba às despesas a que os fundamentos deram origem. Em fins de Setembro de 1884 os trabalhos principais estavam concluídos e em 4 de Outubro procedeu-se à inauguração da nova estação términos das linhas férreas ao sul do Tejo.
O Barreiro viveu então um dia festivo e recebeu altas personalidades da vida pública, entre as quais o ministro António Augusto de Aguiar, que presidiu à cerimónia inaugural da nova estação marítimo – ferroviária.
O pessoal das oficinas tivera folga e toda a população da vila se associou à festa, sem faltarem as duas filarmónicas locais, que abrilhantaram o memorável acontecimento. A estação, naturalmente. Estava “vistosamente decorada e ornamentada mastros, bandeiras, galhardetes, troféus, escudos, grinaldas e festões de verdura”. À noite houve iluminação interior da estação e sarau até à uma hora da madrugada.No próprio dia da inauguração da nova estação do Barreiro, reuniu-se a Câmara Municipal em sessão extraordinária, tendo o cidadão barreirense João Maria de Abreu Moreira enaltecido a figura e a obra do homem que fizera aquilo que muitos consideravam impossível fazer-se : “um cais de embarque que é uma das glórias da engenharia portuguesa” Por proposta do mesmo vereador, imediatamente aprovada por unanimidade, foi dado o nome de Miguel Pais a uma rua da vila, que assim agradeceu ao primeiro visionador da ponte sobre o Tejo a valiosa dádiva. Dois meses depois, já todos os serviços funcionavam na nova estação do Barreiro.
Apoio:
Texto In: Boletim da CP de 1969
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