[ PARA A HISTÓRIA DO COLONIALISMO PORTUGUÊS ]
4. A COLONIZAÇÃO DA GUINÉ
Quando os portugueses chegaram ao Golfo da Guiné, no século XV, encontraram o território ocupado por diversos grupos étnicos vivendo em regime tribal da agricultura e da pastorícia, possuindo formas de autoridade centralizada exercida por chefes hereditários, com uma estratificação social acentuada e um sistema que se pode apelidar de semi-feudal.
Parte desta população professava a religião muçulmana, consequência de antigos contactos com povos mouros do Norte de África, embora muitos conservassem concepções animistas (admitiam em geral um deus criador e vários deuses intermédios ligados aos elementos naturais; água, terra, fogo, etc.).
No primeiro caso estão os Fulas e os Mandingas; entre os animistas, a maioria, várias etnias; Balantas, Mandjaques, Papéis, Barnes, Felupas, Bijagós, Beafadas, Cassangas.
O cronista Duarte Pacheco Pereira escrevia em 1506 acerca dos habitantes desta região: “São de cor muito negra, alguns andam nus enquanto outros vestem-se de algodão. Aqui podem-se comprar escravos à razão de 6 ou 7 por um cavalo e mesmo por um mau cavalo; pode-se comprar também ouro, mas em pequena quantidade”.
Apesar de Diogo Gomes ter chegado à Guiné em 1446, só em 1630 foi criada a Capitania Geral do Cacheu, concluindo-se que durante quase dois séculos a presença portuguesa se limitou à esporádica acção de comerciantes no litoral.
Mais tarde foram criadas, já no século XVIII, as capitanias de Bolama e Bissau, mas o controlo sobre o território era exercido até escassas milhas da costa, onde se processava todo o comércio. Refira-se que durante o período de tráfico intenso de escravos ( séculos XVII e XVIII e parte do século XIX ) a Guiné constituiu uma excepção, pois ainda que existente, a escravatura nunca atingiu proporções semelhantes às verificadas nomeadamente em Angola.
Nos princípios do século XIX a Guiné passou a constituir um distrito independente de Cabo Verde e desenvolveram-se então maiores esforços no sentido da penetração no território. Mas só quando da Conferência de Berlim, em 1885, Portugal decide-se a ocupar de facto a Guiné, sob a pressão internacional das grandes potências. Até aí a autoridade comercial era mantida em núcleos ao longo da faixa litoral, pelo que a investida pelo interior provocou a reacção das populações, dando origem à chamada “Guerra de Pacificação”, que se prolongaria por quase meio século, até 1936, quando foram derrotados os últimos resistentes Bijagós.
Uma a uma, as etnias foram sendo “pacificadas”, em campanhas mais ou menos violentas: os Felupas, Mandjaques, Fulas, Beafadas, Balantas, Oincas, Papéis … Estes, só por volta de 1915, altura em que segundo a autora portuguesa radicada no Brasil, Maria Archer, no seu livro, “Terras onde se fala português”: “… mesmo aqueles habilitados a realizar missões de comércio no interior, tinham de pagar determinada quantia para receberem a permissão do chefe dos Papéis”.
Só nos anos 30 do século XX, Portugal instala de facto a sua administração na Guiné, nunca criando contudo as infra-estruturas necessárias para a exploração do território e deixando cerca de 70% do comércio e da economia nas mãos da França e da Alemanha. A partir do final daquela década porém, a CUF – Companhia União Fabril e o BNU – Banco Nacional Ultramarino, tomaram posições importantes na economia guineense, aparentando contrariar a dependência do exterior mas na realidade associando-se a ela.
A primeira, através da subsidiária Casa Gouvêa, gozando duma situação monopolista, explorando uma mão-de-obra quase gratuita (250 escudos mensais pagava em 1959 aos carregadores portuários, levando-os à revolta e à greve no porto de Pidjiguiti, em Bissau, barbaramente reprimida com 50 mortos) e controlando toda a produção e comércio locais (madeira, amendoim, arroz, cera, óleo de palma e palmiste). Nessa época, 60 mil famílias guineenses eram obrigadas a fazer sementeiras nas próprias terras, para depois os produtos serem comprados a baixos preços pela referida empresa do universo CUF.
No mesmo sentido e no período anterior à guerra colonial, outras empresas portuguesas detinham posições monopolistas na Guiné, nomeadamente: o BNU, como referido, dominava a banca; a Sacor controlava a actividade ligada ao petróleo; a Sociedade Comercial Ultramarina, era única no sector de importação-exportação; a Companhia de Borracha da Guiné, ligada à Fapobol, explorava a produção de borracha; a Sociedade Geral de Transportes do grupo CUF, dominava o sector dos transportes marítimos.
Simultaneamente, os investimentos estrangeiros na Guiné, desde sempre orientados na procura e exploração de matérias-primas, eram corporizados por: Esso Exploration e Royal Dutch Schell, Holanda, prospecção de petróleo; Meats, Holanda – ferro; Wimmer, Alemanha ? ferro; Petrofina, Bélgica – petróleo; Scofai, Japão – pescas e algas, etc.
Uns e outros, juntos ou separados, têm uma acção meramente predadora, pois no início da década de 60, quando o conflito armado se desencadeou, na Guiné-Bissau a indústria local continuava rudimentar e o cultivo e a comercialização continuavam a fazer-se de forma primitiva. Tal era a herança colonial dos portugueses.
Bibliografia :
- O colonialismo português Trabalho de Seminário de Estudo
– ISE, Lisboa, 1970
- Archer, Maria, Terras onde se fala português
– Rio de Janeiro, 1965
- Guerra de África, Guiné – Batalhas da História de Portugal
– Academia Portuguesa de História – Fernando Policarpo,
Lisboa, 2006
Armando Teixeira
2 Responses to "DA GUERRA NUNCA SE VOLTA ! – 4. A COLONIZAÇÃO DA GUINÉ"
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