De novo Cavaco. E agora?

De novo Cavaco. E agora?

No rescaldo da eleição presidencial pergunta-se a cada esquina do país, e agora?

Considerações de quem olha o horizonte político para além do tabique eleitoral que se abriu para o deserto que se lhe segue. Sabemos que para lá do tapume político, o deserto social é a perspectiva de mau caminho para os portugueses. E sabemos, os que recordam, que o vencedor foi um dos responsáveis pelo despovoado ambiente económico do país.

Aposto que o vencedor, não mais volta a olhar, olhos nos olhos a peixeira, o carvoeiro, o madeireiro, o serralheiro, o desempregado, o necessitado, o reformado, o abandonado e o esquecido e vai ter vista larga só e apenas para os que caminham na rua ideológica que de corpo e alma percorre e por onde a sua visão social escala para suceder a si próprio.

Moldar o país a seu jeito, e para a trupe que o rodeia, não deixou margem para dúvidas nas ameaças aquando do cântico de vitória no Centro Cultural de Belém mal terminara a refrega eleitoral.

Ali, separou a plebe, de bandeiras ao alto na sala do lado, das elites mais chegadas no salão nobre do varandim de onde falou. No pedestal, vitoriando-se, fez ameaças para os que no seu entender o caluniaram, mostrando o fraco arcaboiço que um democrata preparado para a discussão deve ter. No alto do balcão, sem contactos e aproximações, fez projecções e ameaças veladas aos “caluniadores” da sua perfeita notabilidade. Ditador não é porque não pode ser, mas vestígios foram visíveis.

Das conjunturas sociais brotam as vítimas espremidas e delas resultam vírus políticos que a doença endémica derrama em epidemias económicas da maior gravidade para o corpo da sociedade.

Ilusionistas políticos repetentes arruínam o país e tiram da cartola novos truques, alienam a mente frágil da população que sofre, esperando um novo remédio político que lhe trate da saúde social, queixando-se da purga a que a obrigam para tratar das feridas.

Povo que não aprende é vítima fácil da sua frágil compreensão social. Sente o castigo e protesta na rua. Associa os seus males à linha política em vigor no Estado e grita os nomes certos para a ocasião. Acossado há largo tempo, mostra em geral registo de compreensão desfasada do que sofre e de quem o faz sofrer.

Cavaco Silva, o vencedor absoluto, possuidor de apenas 23% de votos dos eleitores inscritos, não é a força maior, essa esteve na abstenção dos que se recusaram a ir às urnas somada aos que na urna depositaram o seu voto em branco.

Presidente da elefantina abstenção. Cavaco perde na reeleição com todos os que venceram reeleições presidenciais.

A venda eleitoral, isto é, as campanhas com o vencedor anunciado na comunicação social, em debates de condutores da opinião pública, empurrando o voto para os candidatos do sistema, de certo que ajudaram ao resultado, o que prova, de que o povo não é quem mais ordena, já que a maioria não foi às urnas e Cavaco venceu. A minoria de eleitores transformada em falsa maioria, por demissão de muitos portugueses, contraria as regras democráticas.

Quem vota em branco é como se não existisse, voto sem valor contabilístico que subverte a vontade geral. Sendo voto de protesto de força maior que a abstenção revela posição descrente em todos os candidatos, nomeadamente nos previsíveis vencedores, os que as sondagens favorecem, sublinhando antecipadamente o vencedor para influenciar no caminho da vitória anunciada, sabendo-se que inconscientemente tantos gostam de sentir-se vitoriosos mesmo que por interposta personagem, equipa ou grupo, vivem a vitória subindo na sua própria auto-estima.

Sócrates disfarçou o mau momento que o seu partido atravessa. O povo que o levou ao céu é o mesmo que o afunda no inferno político. Passos Coelho apresta-se para novo cenário governamental mas da mesma espécie com nuances por ventura mais gravosos para os que estão na linha dos mais sacrificados.

Cavaco regressa a Belém ressabiado. A sua intervenção, no rescaldo da vitória, mostrou quanto ressentimento se deitara no fraco estofo político que mostrou guarnecer a sua personagem presidencial ao longo da batalha eleitoral. Veremos no futuro quanta vingança se esconde naquela intervenção de vitória no Centro Cultural de Belém, a sua obra faraónica enquanto primeiro-ministro.

 O povo não aprende com os erros, já são seis actos eleitorais em que participa. No meio da satisfação de repetidas escolhas, esquece facilmente, alheando-se dos desastres sociais de que é vítima.

A responsabilidade dos que no universo político e partidário teimam em antagónica dimensão social, subvertendo os neurónios do povo em protesto na rua e pachorrento na urna, terá um fim, não se sabe quando mas, um dia será.

Hoje é dia para pôr as coisas claras, e é o que aqui fazemos. Que a memória não seja tão curta e todos recordemos o que no dia 23 de Janeiro em Portugal se passara para não persistirmos num quase eterno aval para políticas sociais do tempo das cavernas.

De Carlos Alberto (carló)

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